Por que o STF Não Pode Fechar a Folha de S. Paulo ou Mandar a PF na Casa de Glenn Greenwald
Entenda as razões legais que garantem a liberdade de imprensa e protegem jornalistas como Glenn Greenwald de ações arbitrárias do Supremo Tribunal Federal
Por redação, dia 24 de agosto de 2024
Nos últimos anos, o Brasil tem acompanhado uma série de decisões polêmicas do Supremo Tribunal Federal (STF), com destaque para a atuação do ministro Alexandre de Moraes em casos relacionados à desinformação e ataques às instituições democráticas. Diante desse cenário, surgem questionamentos sobre os limites da atuação do STF em relação à imprensa e à liberdade de expressão, especialmente quando envolve grandes veículos de comunicação, como a Folha de S. Paulo, ou jornalistas investigativos como Glenn Greenwald.
Liberdade de Imprensa é Garantia Constitucional
A Constituição Federal de 1988 estabelece, de forma clara, que a liberdade de imprensa é um direito fundamental no Brasil. De acordo com o artigo 5º, inciso IX, é assegurado o direito à livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. Já o artigo 220 reforça que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição”.
Com base nesses preceitos, o STF tem reiteradamente defendido que qualquer tentativa de censura ou de cerceamento da liberdade de imprensa configura uma violação direta à Constituição. Dessa forma, a ideia de fechamento de um veículo como a Folha de S. Paulo ou a apreensão de material jornalístico, como o celular de Glenn Greenwald, seria não apenas uma medida extrema, mas também inconstitucional.
A Proteção ao Jornalismo Investigativo
Glenn Greenwald ficou famoso no Brasil pela série de reportagens “Vaza Jato”, publicadas em 2019, que revelaram conversas privadas envolvendo membros da Operação Lava Jato. Na época, as reportagens geraram controvérsia e pedidos de investigação contra o jornalista. No entanto, o STF, por meio de decisões fundamentadas na liberdade de imprensa, impediu qualquer tentativa de criminalizar Greenwald por seu trabalho.
A atuação do jornalista foi considerada legítima e protegida pelos princípios constitucionais, mesmo diante das pressões políticas. Para o STF, a liberdade de imprensa inclui o direito de investigar e publicar informações de interesse público, sem que isso implique perseguições judiciais, desde que essas atividades sejam realizadas dentro dos limites legais.
O Papel de Alexandre de Moraes e o Combate à Desinformação
Alexandre de Moraes tem sido protagonista de ações voltadas para o combate à desinformação e à defesa das instituições democráticas. Sua atuação tem sido focada principalmente em figuras que, segundo o entendimento do STF, propagam discursos que ameaçam o Estado Democrático de Direito ou que organizam campanhas de ataques virtuais contra as instituições. Esse rigor tem gerado críticas e acirrado debates sobre os limites da liberdade de expressão.
No entanto, é importante entender que a atuação de Moraes não se dirige a jornalistas no exercício legítimo da profissão, mas sim a indivíduos e grupos que, na visão da Corte, estão envolvidos em práticas ilícitas ou atentatórias à ordem pública. O caso de Glenn Greenwald, até o momento, não se enquadra nesse contexto.
A Linha Tênue Entre Liberdade e Abuso
Ainda que existam limites para o exercício da liberdade de imprensa, como o respeito à honra e à privacidade, o entendimento predominante do STF é de que o jornalismo investigativo desempenha um papel essencial na fiscalização do poder e no fortalecimento da democracia. Medidas como o fechamento de um jornal ou a apreensão de provas em posse de jornalistas só seriam justificadas em situações excepcionais e devidamente amparadas pela legalidade, algo que até agora não ocorreu em relação a Glenn Greenwald ou à Folha de S. Paulo.
Portanto, qualquer medida que atente contra esses direitos fundamentais, sem o devido processo legal e justificação constitucional, seria considerada abuso de autoridade e poderia ser contestada judicialmente. A preservação da liberdade de imprensa é vista como essencial para a democracia, e o STF tem mantido essa posição em suas decisões.
A garantia da liberdade de imprensa no Brasil, conforme estabelece a Constituição, protege tanto grandes veículos de comunicação quanto jornalistas independentes de ações arbitrárias por parte de qualquer poder, inclusive do Judiciário. A atuação de Alexandre de Moraes, embora rigorosa em alguns aspectos, não alcança a censura de jornalistas ou a apreensão de materiais jornalísticos legítimos, pois isso violaria os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.
Apesar de todo o arcabouço jurídico e as garantias constitucionais, há um ponto importante a se considerar: a realidade política e a influência do poder no Brasil. A atuação de Alexandre de Moraes tem sido marcada por decisões ousadas e, em muitos casos, controversas. Embora a Constituição garanta a liberdade de imprensa e a proteção ao jornalismo, existe o temor de que, em uma conjuntura de pressões extremas ou em cenários excepcionais, uma ordem judicial possa ser emitida, mesmo à revelia desses princípios.
Em uma situação hipotética onde o ministro Alexandre de Moraes decidisse, por exemplo, ordenar o fechamento da Folha de S. Paulo ou a apreensão de provas nas mãos de Glenn Greenwald, o que ocorreria na prática? Embora tais ordens fossem imediatamente questionadas e, provavelmente, revertidas em instâncias superiores ou por colegiados do próprio STF, o impacto inicial seria significativo. A execução dessas ordens dependeria, principalmente, do cumprimento por parte de órgãos como a Polícia Federal, que tecnicamente estão subordinados ao Judiciário em questões desse tipo.
Se tal decisão fosse tomada, o caminho institucional previsto seria o pedido de impeachment do ministro. Cabe ao presidente do Senado a prerrogativa de aceitar ou rejeitar esses pedidos. Nesse contexto, o chefe da Casa, caso se visse diante de um cenário de abuso de poder ou evidente desvio de função por parte de Moraes, não teria muita escolha além de acolher o pedido de impeachment e iniciar o processo. No entanto, o histórico do Brasil mostra que a aceitação de um pedido de impeachment de ministros do STF é uma questão delicada, geralmente envolta em negociações políticas e interesses estratégicos.
Assim, ainda que existam mecanismos constitucionais e políticos para lidar com abusos de poder, na prática, a decisão de um ministro do STF, como Alexandre de Moraes, ainda detém enorme peso e poderia causar sérias repercussões antes que qualquer ação efetiva seja tomada para contestá-la. O equilíbrio entre o poder do Judiciário e o respeito aos direitos fundamentais é tênue, e cabe à sociedade civil e às demais instituições garantirem que esse limite não seja ultrapassado.
Dessa forma, embora a Constituição e a jurisprudência do STF protejam a liberdade de imprensa, a realidade política mostra que uma ordem arbitrária poderia, ao menos temporariamente, ser imposta. Nessa situação, a única resposta efetiva seria a pressão pública e a abertura de um processo de impeachment, uma ferramenta que, embora disponível, só seria utilizada em circunstâncias excepcionais e com respaldo político suficiente para desafiar um ministro do Supremo.
Publicar comentário